Em 29 de junho de 1862, com a presença do
imperador D.Pedro II, era inaugurado um novo serviço de transporte de pessoas e
cargas, feito pela empresa Companhia de Barcas Ferry. Uma grande multidão
aguardava a cerimônia na Praça XV, ansiosa em conhecer a novidade. As
embarcações, de origem americana, eram completamente diferentes das aqui
conhecidas, pois tinham duas proas, além de serem movidas a rodas de pás nas
laterais, como nos barcos que percorriam o rio Mississipi. Além disso, foi
construída uma estação para embarque com pontes flutuantes, pois até então eram
usadas simples pontes de madeira.
Todas as melhorias aumentaram tremendamente a
facilidade de se viajar a Niterói, e tanto foi o sucesso que a empresa estendeu
o horário das barcas até 11:30 da noite — isso no ano de 1862, acreditem se
quiser.
Estação Ferry
na Praça XV, em seu aspecto original de 1862
O transporte a vapor para Niterói começou na
verdade bem antes, na época de D. João VI. O monarca outorgou uma concessão a
dois ingleses em 1817, que contudo não levaram a iniciativa adiante. Quatro anos
depois, em 1821, surgiu um serviço irregular ligando o Rio a Niterói e também à
ilha de Paquetá, feito por uma barca chamada Bragança. Também não durou muito
tempo. Em 1834 surgia finalmente a primeira empresa destinada a colocar em ação
um sistema de transporte eficaz entre a capital e Niterói. A Sociedade de
Navegação de Nichteroy começou o serviço no ano seguinte com três barcas:
Nichteroyense, Praia Grande e Especuladora. Com capacidade para 250
pessoas, trafegavam de hora em hora, criando a primeira ligação de fato com
Niterói.
A empresa se fundiria em 1852 com a Companhia de
Inhomirim, que realizava serviço para Porto da Caixas e Porto da Estrela, e que
havia obtido permissão para estender suas linhas. Além de levar passageiros até
Niterói e ao rio Inhomirim e as ilhas de Paquetá e do Governador, a empresa
regularizou o transporte até São Cristóvão e Botafogo, onde os passageiros
podiam desembarcar em frente à rua Marquês de Olinda ou na São
Clemente.
A Companhia Nichteroy-Inhomirim, contudo,
não conseguiu resistir à concorrência da Barcas Ferry, que fazia as viagens em
muito menos tempo e com mais conforto, e encerraria suas atividades em 1865,
três anos sómente após a entrada da concorrente no mercado. A Cia. de Barcas
Ferry, por sua vez, se fundiria em 1889 com a Empresa de Obras Públicas no
Brasil, a nova empresa passando a se chamar Companhia Cantareira e Viação
Fluminense, a qual dominaria o transporte marítimo na Baía da Guanabara até os
anos 50, sendo famosa pela péssima qualidade dos serviços em seu período final,
fato que levou em 1959 à Revolta das Barcas, com diversos incêndios, mortos e
destruição da estação de barcas de Niterói.
A utilização do transporte marítimo em uma cidade
banhada pelo mar como o Rio de Janeiro é uma opção óbvia, e, como por se
depreender do pequeno resumo histórico acima, era isso mesmo que se pensava no
século XIX, quando surgiram essas iniciativas. Mas, durante o século passado,
principalmente após a Segunda Guerra, procurou-se tudo sucatear em favor do
transporte rodoviário, uma opção estúpida que deixou o país sem uma
infraestrutura de transporte adequada à suas dimensões, gerando uma carência
responsável por boa parte do famoso "custo Brasil", pago por todos
cotidianamente. Assim, por exemplo, em um primor de irracionalidade, são
frequentemente enviadas mercadorias em caminhão do Rio Grande do Sul ao Pará,
por falta de uma opção eficiente de transporte por cabotagem.
O transporte marítimo também poderia ser uma
excelente opção a nível urbano, pois hoje em dia existem embarcações do tipo
catamarã que enfrentam com facilidade o mar aberto, como por exemplo entre a
Espanha e o Marrocos ou entre a Dinamarca e a Suécia, que poderiam ligar a Barra
ao Centro ou a outros pontos da baía de Guanabara, ou quem sabe até o Rio a Cabo
Frio. Todas essas soluções, assim como a modernização do transporte ferroviário,
são possíveis, e poderiam representar um avanço na qualidade dos serviços ao
resgatar uma parte do atraso e da pobreza que representa o transporte
rodoviário, imposto há décadas a toda população como única opção.
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