Rica arquitetura da Avenida Rio Branco proporciona viagem no tempo
Inaugurada em 1905 como um dos marcos da remodelação da cidade capitaneada pelo prefeito Pereira Passos, a então Avenida Central nasceu sob a inspiração de Paris
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A Biblioteca Nacional é um dos prédios, do início do século XX, que preservam
o glamour da Rio Branco Custodio Coimbra / O Globo
RIO - Uma caminhada pela Avenida Rio Branco, no Centro do Rio, pode ser uma
viagem ao passado se o pedestre souber olhar para os lugares certos. Inaugurada
em 15 de novembro de 1905 como um dos marcos da remodelação da cidade
capitaneada pelo prefeito Pereira Passos, a então Avenida Central nasceu sob a
inspiração de Paris: com 1.800 metros de extensão, 33 metros de largura,
pequenos abrigos para transeuntes, e prédios em estilo eclético. Passados mais
de 100 anos, a via mudou completamente e pode-se contar nos dedos das mãos os
edifícios que restaram destes primeiros tempos. Até 1910, eram 86 prédios; hoje,
só sobraram 10. Desses, seis são públicos e tombados pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e pelo Instituto Estadual do
Patrimônio Cultural (Inepac): o Banco Central, a Biblioteca Nacional, a própria
sede do Iphan, o Museu Nacional de Belas Artes, o Teatro Municipal e o Centro
Cultural da Justiça Federal, antiga sede do Supremo Tribunal Federal. Também são
tombados pelo estado o prédio do Clube Naval e os imóveis 88 e 155 da avenida,
que pertencem, respectivamente, à Ordem Terceira de Nossa Senhora da Conceição e
Boa Morte e à Santa Casa da Misericórdia.
Para o professor de geografia da Uerj, João Baptista Ferreira de Mello,
coordenador dos Roteiros Geográficos do Rio, apesar de não ter sido preservada
em seu conjunto, a avenida dá aula de história:
— A Avenida Central era nossa Paris: uma via ligando o mar ao mar, pois não
havia os aterros do Flamengo e do porto, com prédios belíssimos em estilo
eclético francês.
No sábado, a partir das 15h, ele guiará cariocas e turistas no roteiro
“Avenida Rio Branco de Ponta a Ponta.” O passeio começa no nº 1, marco dos
edifícios pós-modernistas. As inscrições, gratuitas, são pelo site
www.roteirosdorio.com.
Da Belle Époque aos traços modernistas
À época de sua abertura, todas as construções da Avenida Rio Branco
(inaugurada com 30 prédios acabados e 85 ainda sendo erguidos) obedeceram às
regras de um concurso de fachadas que previa prédios parecidos com os da capital
francesa. No número 30, fica o prédio da antiga Caixa de Amortização, hoje Banco
Central, construído junto com a avenida e inaugurado em 1906. O interior tem uma
rotunda decorada por painéis de mosaicos dourados. Na fachada, colunas
neoclássicas em mármore de Carrara e janelas decoradas com guirlandas.
A lista de edificações remanescentes inclui ainda o prédio do número 19, onde
está o Hotel São Bento, na Praça Mauá. Projetado pelo arquiteto Vicente de
Carvalho e inaugurado em 1906, fica na esquina das ruas Dom Gerardo e São Bento
e está degradado.
Traçado sofreu desvio
Cruzando a Avenida Presidente Vargas, o roteiro traz mais exemplos da época
em que a Rio Branco tinha ares parisienses: a construção do número 88, entre a
Igreja de Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte e a avenida, de 1908, já
abrigou uma lotérica e o Bar Simpatia, fechado em 1990. No local, há uma loja de
roupas masculinas. O prédio tem uma torre gótica, grades em estilo art-nouveau e
desenhos de cerâmica vitrificada. A história explica como ainda está ali.
— Na época da construção da avenida, a Igreja da Nossa Senhora da Conceição e
Boa Morte, de 1738, não foi demolida porque o engenheiro Paulo de Frontin, da
Comissão Construtora, devoto da santa, desviou um pouco o traçado — conta João
Baptista.
Outro imóvel do início do século XX fica entre os números 155 e 159 e
pertence à Santa Casa de Misericórdia. No lado esquerdo, aina é possível ver
características da Belle Époque, enquanto, no direito, há uma nova fachada de
linhas retas. Na esquina com a Avenida Almirante Barroso fica o Clube Naval,
inaugurado em 1910, do arquiteto Tomazzo Galdenze, que também assina o Teatro
Colón de Buenos Aires. Ao longo dos anos, o prédio teve a estrutura interna
alterada e ganhou mais dois pavimentos em 1924.
Erros levam à reflexão
Para o arquiteto e urbanista Nireu Cavalcanti, a história da construção e
posterior descaracterização da antiga Avenida Central deveria gerar uma reflexão
sobre o futuro das intervenções urbanas da cidade:
— Para que a avenida fosse construída, houve desapropriações e muitas perdas.
No lugar, foi construída a mais bela avenida do Brasil, mas ela não chegou a ter
50 anos de vida quando acabou descaracterizada porque não havia sido protegida —
observa Nireu, citando como exemplo de perda o Palácio Monroe.
O consultor Carlos Fernando Andrade, ex-superintendente do Iphan no Rio,
destaca o tombamento tardio e parcial dos prédios da Rio Branco:
—Na época, o único órgão de proteção do patrimônio era o Iphan, cujos
arquitetos não apreciavam prédios ecléticos, preferiam o modernismo. Há um
parecer de Lúcio Costa pedindo o tombamento de apenas quatro prédios, o Teatro
Municipal, o Museu de Belas Artes, a Biblioteca Nacional e o prédio do
Supremo.
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