FALE COM OS MONARQUISTAS !

FAÇA PARTE DO NOSSO GRUPO NO YAHOO

Inscreva-se em DMB1890
Powered by br.groups.yahoo.com

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

GASTÃO REIS: DEMOCRACIA EX-ANTE E EX-POST




DEMOCRACIA EX-ANTE E EX-POST

Gastão Reis



Antes de mais nada, uma explicação. O uso dos termos latinos ex-ante e ex-post não se prende a nenhum tipo de saudosismo. Na verdade, foram as melhores palavras que encontrei para definir com rigor os problemas da teoria e da prática democráticas em nosso país. Estes termos têm largo uso em economia. Ex-ante (antes do evento, em latim) tem a ver com nossas expectativas diante de um evento futuro ou aquilo que ocorre antes de um determinado ato. Já ex-post (após um dado evento) está ligado ao fato consumado, aos resultados efetivos a que chegamos. Existem várias definições de democracia. Ao pé da letra, esta palavra é composta de duas outras de origem grega: demos, que quer dizer povo, e kratia, que significa força, poder. Poder do povo ou governo do povo. Abraão Lincoln lapidou essa conceituação clássica ao definir democracia como o “governo do povo, pelo povo e para o povo.” Podemos aproveitar o poder de síntese de Lincoln para definir democracia ex-ante e democracia ex-post. No conceito ex-ante, ela significa o governo do povo pelo povo, ou seja, a soberania é do povo que exerce o poder através de seus representantes eleitos. A democracia ex-post tem a ver com o governo para o povo, ou seja, em benefício efetivo da população.

Com base nessas duas conceituações, podemos afirmar que o Brasil tem hoje uma democracia ex-ante bastante avançada e uma democracia ex-post, que deixa muito a desejar, sofrível mesmo. Nós fazemos uma certa confusão em relação a esses dois conceitos. Uma coisa é dispor de um sistema político aberto, com muitos partidos, em que os cidadãos têm acesso aos cargos eletivos com facilidade. Um país com 28 partidos certamente oferece amplas possibilidades para tal. Até aqui estamos no reino da democracia ex-ante. Outra coisa, muito diferente, é saber se, uma vez eleitos, os políticos e a estrutura político-administrativa do país respondem à altura aos anseios populares em termos de preservação do interesse público. A resposta a essa segunda questão vem sendo reafirmada, de forma muito negativa, pela população brasileira que, em reiteradas pesquisas, avalia o desempenho dos políticos e de nossas práticas político-partidárias da pior maneira possível. Normalmente, 80% da população cravam entre o ruim e o péssimo quando solicitada a se manifestar. Por quê? Eis a questão.

Curiosamente, no seio de nossa pobre evolução institucional, tivemos no passado, em especial sob o Segundo Reinado, uma boa democracia ex-post, em que Pedro II, via poder moderador, dispunha de instrumentos efetivos para preservar o interesse público, e uma democracia ex-ante que deixava a desejar pela forma manipulada com que eram realizadas as eleições, fato este reconhecido pelo próprio monarca. Daí sua visão de futuro que o levava a chamar ora o líder de um, ora do outro partido, para que os liberais e os conservadores se alternassem no poder. Ele sabia que a alternância dos partidos no poder era peça fundamental na construção de uma democracia sólida ao longo do tempo.

A despeito dos avanços, a república no Brasil (e dos supostos valores republicanos alardeados) não conseguiu fazer com que a população percebesse a política e os políticos como instrumentos fidedignos de preservação de seus interesses. Três são as razões que explicam nosso desalento em matéria político-institucinal, não obstante os avanços nos planos social e econômico.

A primeira delas tem a ver com o número excessivo de partidos com representação no congresso nacional. Qualquer melindre pessoal faz com que o político mude de partido. Ele dispõe de 27 alternativas, responsáveis em boa medida pelo fato de os políticos não servirem aos partidos, mas, sim, deles se servirem. Fidelidade partidária sem cláusula de barreira é como corda sem caçamba. Simplesmente não funciona. Ressalve-se que o Brasil poderia continuar a ter muitos partidos, mas relativamente poucos com representação.

A segunda razão é nossa concepção equivocada de democracia que vê no voto obrigatório algo imprescindível ao processo de participação popular. O voto facultativo tem o mérito da qualidade. Quem vota sem ser obrigado pensa

melhor no voto que vai pôr na urna. Quem comparece à seção eleitoral por pura obrigação, votando mal informado, presta um favor à cidadania em não votar. Merece registro uma observação de ordem estatística. Somando-se os votos de quem falta com os brancos e nulos, o percentual efetivo de votantes em nossas eleições fica entre 60 e 65% do eleitorado total. Se o voto fosse facultativo, votariam entre 50 e 60% dos eleitores, ou seja, praticamente o mesmo número. Mais ainda: a teoria da amostragem nos garante que uma amostra de 50 ou 60% do eleitorado é mais que suficiente para se manter o resultado final. Em outras palavras: aumentar o número de votantes de 50 para 60 ou mesmo 100% muito dificilmente mudaria o resultado de um pleito.

O terceiro ponto se refere à ausência do voto distrital ou do voto distrital misto. O efeito devastador dessa deficiência é que tendemos a votar mal informados e, ainda, com isso, permitimos que o poder econômico fale muito alto nas disputas eleitorais. É óbvio que um candidato a vereador (ou a deputado estadual ou federal), ao ter que centrar sua campanha em um ou poucos bairros de sua cidade, ou seja, no seu distrito eleitoral, ele pode fazê-lo quase que a pé. Melhor ainda: ele vai prestar conta de seus atos aos eleitores de seu distrito, permitindo a estes últimos acompanhar facilmente seu desempenho e votar realmente com conhecimento de causa na próxima eleição.

Finalmente, e o mais trágico, é que a atual legislação eleitoral e partidária impede a formação de partidos sólidos e coesos e perpetua a manutenção de uma visão extremamente negativa por parte da população em relação à política e aos políticos. Sem que voltemos, através de uma profunda reforma político-institucional e partidária, a ver nossos representantes nos poderes executivos e legislativos (municipal, estadual e federal) novamente com respeito, vamos criar sérios problemas a médio e longo prazos para dar continuidade aos avanços sociais e econômicos obtidos, pois a reestruturação político-institucional é fundamental para garantir sua sustentabilidade, como comprovam pesquisas e estudos muito bem fundamentados. A longo prazo, boa economia depende de boa política.

Nenhum comentário: