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segunda-feira, 23 de maio de 2011

Gelosias e Urupemas

Gelosias e Urupemas

22/05/2011 - 16:51
Enviado por: Paulo Pacini
JB


Ao pensarmos na vida do Rio de antigamente, quase sempre ocorrem imagens da época imperial, especialmente o reinado de D. Pedro II.

Não é difícil visualizar um passeio pelas ruas dos contos de Machado de Assis e José de Alencar, quando muitos dos confortos (e flagelos) modernos não existiam. Provávelmente nos adaptaríamos a esse mundo, imbuído de uma relação de familiaridade análoga a que teríamos com nossos bisavós ou tataravós.



Muito diferente a época colonial, quando a vida cotidiana e as relações aconteciam de forma (para nós) difícil de assimilar. Seria como uma viagem a um planeta estranho, dotado de uma atmosfera ainda respirável, mas com um meio-ambiente nos afetando de modo extremamente desagradável. A estranheza seria comum a todos, mas, para as mulheres de hoje, viver nessa época seria comparável a uma passagem só de ida ao inferno, com restrições difíceis até de se imaginar.





Sobrados da época de D. João VI, ainda com vestígios de gelosias (rótulas) no andar superior



A esposa e filhas do chamado homem de bem eram objetos de propriedade exclusiva, sobre os quais exercia poder absoluto, podendo punir, maltratar ou até matar. Viviam em regime de clausura, saindo pouquíssimas vezes durante o ano. Vigiadas o tempo todo e sem acesso à educação, o desejo exacerbado de posse de seu dono as guardava de olhares alheios, seja através do uso da mantilha, usada como uma espécie de burka light, mas principalmente através da adaptação das moradias ao objetivo explícito de ocultar.



A palavra ciúme, que na maioria das línguas indo-européias tem uma raiz pronunciada aproximadamente gelos — no francês jealousie, em espanhol celos ou no inglês jealousy, dentre outros idiomas — serviria para nomear um dos elementos arquitetônicos mais usuais do período colonial. Popularizado durante os séculos de ocupação moura na península ibérica, o desejo de esconder as mulheres levou à adaptação das moradias a esta finalidade.

Para evitar que qualquer estranho tivesse a possibilidade de vislumbrar o interior, eram colocadas, nas janelas e portas, treliças de madeira ou de urupema, fibra vegetal. Este dispositivo receberia o nome adequado de gelosia ou rótula, e dificultava a quem estivesse na rua conseguir distinguir algo dentro da casa. Em casos extremos as grades de madeira cobriam toda fachada do imóvel, só por via das dúvidas. Neste cárcere paterno viviam as jovens, passando posteriormente, pelo casamento, para aquele do marido.



Quando a côrte portuguesa chegou, em 1808, uma das primeiras providências tomadas pelo intendente de polícia Paulo Vianna, cargo que equivalia ao de prefeito, foi a remoção das gelosias por razões de estética e segurança, pois algum possível malfeitor poderia se esconder nelas para atentar contra a vida do monarca. O edital de 11 de junho de 1808 colocava que "não se pode nem deve continuar a tolerar bisonhos e antigos costumes", declarando "desde já que devem abolir as rótulas das janelas dos sobrados, que desaparecerão em oito dias".



Sumia o velho dispositivo mourisco, permanecendo, contudo, vestígios em alguns imóveis, desde que não se chocassem com o decreto. Era o início da reforma de costumes que desembocaria no período imperial e no conhecido Rio de Janeiro cosmopolita do século XIX. As últimas casas trazendo algumas dessas características desapareceriam nos primeiros anos do século seguinte, levando consigo os derradeiros traços da arquitetura e costumes do distante período colonial.



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