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sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Iphan premia instituto carioca por salvar o Cemitério dos Pretos Novos

Enviado por Berenice Seara - 27.08.2010
16h15m

Iphan premia instituto carioca por salvar o Cemitério dos Pretos Novos




O Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos, no Rio de Janeiro, foi o vencedor da categoria salvaguarda de bens de natureza imaterial do concurso Rodrigo Mello Franco de Andrade, deste ano, promovido pelo Iphan.

O trabalho, realizado por Petrucio e Merced Guimarães, foi iniciado em 1996, com o salvamento do Sítio Arqueológico Pretos Novos, situado no bairro da Gamboa.

O achado fortuito de ossadas de escravos sob a residência do casal deflagrou o processo de preservação, que acabou atingindo as residências vizinhas, compradas posteriormente em prol daqueles vestígios da história.



Em 2005, foi criado o instituto que hoje é responsável não só pela manutenção da integridade do local, como principalmente pela divulgação do achado e sua importância para a nossa memória cultural.

Seus objetivos são estudar, pesquisar e preservar a história das culturas afro e afro-brasileira.

O IPN conta hoje com um corpo técnico formado por professores, pesquisadores, artistas e colaboradores e desenvolve projetos de pesquisa, realiza palestras e cursos para escolas e para o público em geral.

Além disso, promove eventos culturais variados, incluindo exposições itinerantes.



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Escravos à flor da terra

Negros africanos eram enterrados a um palmo do chão em cemitério na zona portuária do Rio




DANIELA MENDES
ISTO É

 

HISTÓRIA O viático, de Debret , retrata nobres e escravos do Rio de Janeiro. A escravidão durou mais de 300 anos no Brasil



A família de Ana Maria de la Merced realizou o sonho de comprar o imóvel próprio em 1990. Pequenos empresários, eles colocaram todas as economias numa antiga casa da zona portuária do Rio de Janeiro. Levaram seis anos para começar uma reforma no imóvel datado de 1866 e ampliado em 1913. Quando o pedreiro fez o primeiro buraco no piso da sala, a surpresa: a meio palmo do chão, apareceram ossos, que ele supôs serem de cães. "Isso não é cachorro não, é gente", disse Ana Maria, segurando uma mandíbula.



Foi assim que ela descobriu que sua casa estava em cima do cemitério dos pretos novos (nome dado aos escravos recém-chegados), o local onde eram enterrados os negros traficados da África que morriam antes de serem vendidos - quem falecia no trajeto era jogado ao mar, mas quando o navio já estava dentro da Baía de Guanabara o indivíduo tinha de ser sepultado em terra. O cemitério esteve ativo entre 1722 e 1830. Até 1769, funcionava no largo da Igreja de Santa Rita e depois na rua Pedro Ernesto, onde hoje é a casa de Ana Maria. Uma inédita pesquisa do historiador Júlio Cesar Medeiros da Silva Pereira detalha o destino cruel desses escravos. A tese de mestrado de Júlio pela UFRJ virou o livro À flor da terra: o cemitério dos pretos novos no Rio de Janeiro (editora Garamond, 204 págs., R$ 32,40), com apoio do Arquivo da Cidade.



O historiador baseou seu trabalho nos registros feitos no livro de óbitos da Freguesia de Santa Rita, que administrava o cemitério. O livro com dados traz a marca dos escravos, nome do traficante, sexo, faixa etária, porto de origem e data do sepultamento.



Segundo ele, somente nos últimos seis anos de funcionamento, espectro abrangido por sua pesquisa, o cemitério recebeu 6.119 corpos. "A grande maioria era de homens, o comércio de escravas não era tão comum", conta. A maior parte vinha de Moçambique, Angola e República Democrática do Congo. As principais etnias eram mina, cabinda, congo, kassangue, angola, benguela e moçambique.



As degradantes condições de transporte dos negros da África para o Brasil faziam com que eles chegassem debilitados. Muitos contraíam varíola ainda em portos africanos e manifestavam a doença no desembarque. Às vezes, eles esperavam semanas para serem vendidos e não resistiam. Os traficantes pagavam a Igreja de Santa Rita para enterrá-los. Os corpos eram amontoados por dias, queimados de tempos em tempos e sepultados em valas comuns e muito rasas. "Eles eram enterrados sem nenhuma dignidade, uma violência para a cultura deles", diz Júlio.



TRADIÇÃO Largo de Santa Rita, de Hildebrant, onde funcionou o primeiro cemitério de pretos novos (à esq.), e Enterro de uma negra, de Debret, que mostra a solenidade dos funerais africanos



Na religiosidade africana, o culto ao antepassado é feito na hora do sepultamento. Eles não podiam ser enterrados à flor da terra, como acontecia, porque acreditavam que, dessa forma, seus restos mortais ficavam à mercê dos feiticeiros. "Segundo as crenças, não ter um sepultamento digno também significava que a sorte deles nunca iria mudar, além de representar uma quebra da linhagem", explica Júlio. Em 1830, a pressão da Inglaterra resultou na lei "para inglês ver" que proibia o comércio de escravos. A legislação não pegou, o tráfico negreiro só acabou 20 anos depois, mas o cemitério dos pretos foi desativado e esquecido.



A descoberta das ossadas da rua Pedro Ernesto jogou luz neste capítulo da história do Brasil. A casa de Ana Maria foi transformada em sítio arqueológico pela prefeitura. Entre 1996 e 1999, ela, o marido e as duas filhas adolescentes conviveram com quatro buracos abertos no meio da sala. Uma vez por semana, durante quatro meses, uma arqueóloga ia peneirar a área. De lá, saíram crânios, fêmures e mandíbulas de 28 indivíduos com idades entre 18 e 25 anos e mais de cinco mil fragmentos de ossos, além de miçangas e louças antigas.



Para dar continuidade à reforma iniciada em 1996, Ana Maria contratou uma empresa de sondagens de solo. Foi constatada a existência de ossos numa profundidade entre 5 centímetros e mais de dois metros. "Solo firme só depois de 11 metros de profundidade", conta a empresária, que conseguiu terminar a obra somente em 2001 depois de mudar- se com a família para o auditório de sua empresa de prestação de serviços. Outras casas da rua que foram reformadas também se depararam com ossadas.



Apesar de todos os transtornos, Ana Maria encantou-se com a história que descobriu, literalmente, sob os seus pés. "Aqui é o ponto zero da escravidão", diz ela. "O Rio é a cidade onde desembarcaram mais escravos, pois era um entreposto." Ela manteve sua sala aberta à visitação durante anos e hoje busca preservar a memória da época com o Instituto dos Pretos Novos. O trabalho do historiador Júlio Cesar é uma importante contribuição para manter viva a história afro-brasileira.






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