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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

CANHÕES SÃO ENCONTRADOS NA ZONA PORTUÁRIA


Arqueólogos acham canhões de pelo menos 400 anos na Zona Portuária


Equipe localiza dois exemplares que podem ser os mais antigos do país



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Um dos canhões descobertos na Rua Sacadura Cabral, no Centro
Foto: Foto de leitor / O Globo


Um dos canhões descobertos na Rua Sacadura Cabral, no Centro Foto de leitor / O Globo
RIO - Uma equipe de arqueólogos do Museu Nacional descobriu na segunda-feira, na Zona Portuária, dois canhões que podem ser os mais antigos do Brasil. Os trabalhos, coordenados pela professora Tânia Andrade Lima, fazem parte do monitoramento arqueológico realizado no decorrer do projeto Porto Maravilha, de revitalização da Zona Portuária.
Os dois canhões, em princípio, são ingleses e do século 17. De acordo com Tânia, há a possibilidade, porém, de serem do século 16:
— Isso os tornaria, talvez, os mais antigos do Brasil. Com certeza são os mais antigos do Rio. Estávamos escavando os trapiches do século 19 que existem ao longo da Rua Sacadura Cabral e, inesperadamente, surgiram essas peças. Os equipamentos faziam parte de uma bateria de canhões que ficava ao longo da praia, no pé do Morro da Conceição.
Os armamentos teriam servido para defender as terras cariocas de invasões. Era, segundo a arqueóloga, parte de um sistema de defesa que funcionava ao longo da costa. Agora, os profissionais do Museu Nacional vão começar as análises técnicas para detalhar a história dos objetos.
A equipe é a mesma que, desde março de 2011, pesquisa o material arqueológico encontrado no Cais do Valongo, ali perto, ao longo da Avenida Barão de Tefé. Os pesquisadores já conseguiram retirar objetos que permitem remontar como era o cotidiano dos escravos que chegavam da África, como mera mercadoria, na primeira metade do século 19. Os materiais resgatados do solo mostram, sobretudo, como os negros tentavam proteger seus corpos diante do tratamento imposto por portugueses e ciganos especializados na compra e venda de escravos.
Depois das escavações, deve ser erguido no local um memorial da diáspora africana.
Peças de dominó, moedas e cristais no Cais do Valongo
A arqueóloga Tânia Andrade Lima, que coordena a escavação no Cais do Valongo, explica por que os objetos dos escravos são tão importantes.
— Os negros não puderam depor sobre seu sofrimento, desespero, angústia, trajetória e jogo de cintura para sobreviver aqui. Mas aqui temos um discurso silencioso. Largaram essas coisas para trás, no chão. Por meio desses materiais, estão falando acerca deles mesmos para nós e seus descendentes. É a herança que deixaram — conta a arqueóloga.
A Rua do Valongo, atual Camerino, era o endereço das lojas de venda de escravos, descritas por viajantes como dantescas. Antes de serem postos à venda, os africanos eram separados. Os que chegavam de viagem com graves problemas de saúde iam, sem misericórdia, diretamente para o Cemitério dos Pretos Novos. Os doentes tratáveis eram levados para o Lazaredo, local onde eram curados e engordados para futura venda. Tudo funcionava como um grande complexo.
— A realeza se fez suficientemente lembrada e escreveu sobre si mesma. Já os negros do Valongo foram cuidadosamente tapados por toneladas de terra, precisamente em cima, para Teresa Cristina Maria de Bourbon chegar e se casar com Dom Pedro II na década de 1840. O Cais da Imperatriz foi feito sobre o Valongo porque aquela área era uma vergonha — explica Tânia.
Detalhes de como era a vida no porto há 200 anos
O jogo era proibido na primeira metade do século 19. Mesmo assim, escravos e pessoas que frequentavam a região apostavam freneticamente. A Zona Portuária já era conhecida por ser um local do "tudo pode". Os dados e peças de dominó achados nas escavações representam a transgressão possível às leis daquela época. Foram encontradas várias peças de dominó. A parte de baixo era feita com osso de boi e ficava presa com uma espécie de prego à madeira gravada com os números do jogo. Impressiona a qualidade e o padrão do material, produzido com poucos recursos, mas que garantia um mínimo de distração e diversão a quem não tinha direito à liberdade.
As moedas de cobre encontradas pela equipe do Museu Nacional eram de baixíssimo valor na época. Várias estão perfuradas no meio porque os escravos as usavam como talismãs. Para eles, o cobre era coberto de simbolismo, entendido como um metal sagrado que protegia o corpo. Também foram achados cristais de quartzo que, segundo a crença dos escravos, serviam para refletir o "mal".
— Eles tentavam se proteger desesperadamente de todas as formas. Achamos muito material para a proteção do corpo, que era violado e brutalizado — diz Tânia.

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