Polícia Militar diz que estado vai demolir QG para vender imóvel
Conselho municipal ainda precisa dar autorização porque prédio faz parte de Apac
RIO - A Polícia Militar informou nesta quarta-feira que a Empresa de Obras Públicas do Estado (Emop) ficará encarregada da demolição de todo o conjunto arquitetônico do centenário Quartel-General da Polícia Militar, na Rua Evaristo da Veiga, no Centro. Ainda não foi informado se a Emop é que fará a demolição ou se contratará uma empreiteira. Assim, o governo do estado atenderá à exigência que a Petrobras fez para a compra do imóvel, por R$ 336 milhões. Diante de tentativas da Câmara dos Vereadores e da Alerj de tombar o prédio, cuja construção original data de 1740, a demolição evitará embargos à negociação e ao novo empreendimento. Antes, porém, a demolição terá que ser autorizada pelo Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural, já que o imóvel está dentro de uma Área de Proteção do Ambiente Cultural (Apac).
Nesta quarta-feira, a prefeitura informou que, de acordo com norma do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), modificações na estrutura de todos os imóveis construídos antes de 1938 devem passar pelo crivo dos conselhos municipais de proteção do patrimônio cultural. Mas nenhuma solicitação de análise da negociação havia sido feita à prefeitura até ontem, segundo informou a assessoria de imprensa.
No terreno do imóvel foram plantadas, no século XVIII, as primeiras mudas de café que depois seriam levadas para o interior do Rio e de São Paulo. Segundo avaliação do historiador Nireu Cavalcanti, o critério para se tombar um imóvel tem deixado de lado verdadeiras relíquias da História nacional.
— A ideia do Iphan era tombar imóveis pelo valor arquitetônico e cultural. Se o imóvel for bonito, tomba-se. Mas há de se refletir sobre o valor histórico das construções. O Quartel-General da Polícia Militar foi sendo reformado com o tempo. No século XIX, assumiu uma arquitetura sisuda, sombria, como é de costume em construções militares. Mas aquilo lá está impregnado de história — disse Cavalcanti.
Segundo ele, a maioria das igrejas construídas na cidade é tombada pelo simples fato de que descaraterizar ou demolir um santuário poderia significar um pecado e “a abertura da porta para o inferno”.
— Nos fundos da Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores, na Rua do Ouvidor, no Centro, tem um casarão do século XVIII que não é tombado. A igreja, que é tombada, mantém o imóvel, que é belo e tem uma história importante — disse o historiador.
— O 1º Batalhão de Cavalaria do Exército do Rio, em São Cristóvão, onde ficam as antigas cavalariças imperiais, que faziam parte da Quinta da Boa Vista no tempo do Império, foi comprado pela prefeitura para a construção de um estacionamento do Maracanã. Não há preocupação com o passado da cidade.
Em nota, o governo informou nesta quarta-feira que a Lei Geral das Licitações (número 8.666/93) permite ao estado que faça a opção entre licitar ou vender diretamente um bem, quando o comprador em questão for uma entidade da administração pública, seja direta ou indireta. Segundo o governo, no caso da Petrobras, trata-se de uma entidade da administração pública indireta, ou seja, é uma sociedade de economia mista. “Cabe ressaltar que todo o processo foi acompanhado pela Procuradoria Geral do Estado, que apresentou parecer fundamentado sobre a legalidade da transação”, diz o texto.
Qualquer cidadão pode pedir tombamento
De acordo com um nota da prefeitura, o artigo 216 da Constituição Federal estabelece que “o ato de tombamento de um bem pelo poder público municipal é da competência do prefeito, mas todo cidadão tem direito a requerer o estudo de tombamento de um bem.
O cidadão poderá abrir um processo no protocolo do CASS (Centro Administrativo São Sebastião)”.
Na petição deverão constar “as razões do pleito, bem como levantamento fotográfico do imóvel e do seu entorno”.
O Quartel-General da PM não é um imóvel tombado, mas desde que começaram as especulações para a venda da área, houve reações contrárias ao projeto, alegando que o QG possui valor histórico.
Em 2008, a Associação de Oficiais Militares Estaduais do Rio de Janeiro (Ame-RJ) encaminhou para a Câmara do Rio uma proposta de preservação de todo o imóvel.
A partir da iniciativa, um projeto de lei apresentado pelo vereador Carlo Caiado (DEM) tramita na Casa.
Este ano, foi apresentado na Assembleia Legislativa um outro projeto de lei, de autoria do deputado Paulo Ramos (PDT), que também pede o tombamento da sede da PM. Na justificativa, o parlamentar cita que “em 10 de julho de 1865, partiram do quartel — à época conhecido como Barbonos da Corte — 510 oficiais e praças para lutar na guerra do Paraguai, sob a denominação de 31 Corpo de Voluntários da Pátria”. Outro elemento histórico citado foi o fato de o local ter sediado o Corpo de Guardas Permanentes, que era comandado pelo Duque de Caxias, no período de 1832 a 1839. Na terça-feira, Paulo Ramos informou que vai encaminhar para votação, em regime de urgência, o projeto de lei.
Governo afirma que a venda de terreno é legal
O governo do Estado afirmou em nota, nesta quarta-feira, que a venda do terreno do QG da Polícia Militar para a Petrobras, anunciada na segunda, é legal. Desde o início do mês, a negociação do terreno já era questionada pelo Ministério Público. No dia 3 de maio, a 1ª Promotoria de Tutela Coletiva da Cidadania da Capital entrou com uma ação para investigar a legalidade da venda, uma vez que o prédio é um bem público.
O comandante geral da PM, coronel Erir Costa Filho, também voltou a afirmar, através de sua assessoria de imprensa, que a venda do QG da corporação está em negociação porque a PM precisa de recursos para sua modernização. Segundo ele a venda do prédio vai angariar recursos para a instituição. O comandante da PM, através da assessoria, acrescentou ainda que a capela é sustentada pela PM mas não faz parte da instituição.
Na terça-feira, o governo do estado informou que a capela da Arquiepiscopal Irmandade Imperial Nossa Senhora das Dores, construída no século XIX no terreno do Quartel-General da Polícia Militar, será preservada, mesmo após a venda da área para a Petrobras. O prédio do QG, erguido no século XVIII para abrigar frades franciscanos italianos, terá destino diferente quando a venda for efetivada. Ele deverá ser demolido para a construção de um novo edifício da estatal.
Como O GLOBO antecipou, em março deste ano, a ideia do governo do Rio de acabar com o chamado aquartelamento dos policiais, com unidades menores, e maior contingente de policiais nas ruas. Na ocasião, o secretário estadual de Segurança, José Mariano Beltrame, explicou que pretendia transformar os batalhões em estruturas mais verticais, à semelhança do que já ocorre, por exemplo, em Los Angeles e Nova York, nos Estados Unidos. E que se reunira com o secretário da Casa Civil, Régis Fitchner, para discutir a construção de um prédio no QG da corporação.
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