Rio - Uma prática instituída no início do século 19, com a chegada da Família Real ao Brasil, está tirando o sono dos moradores do Morro da Providência, a primeira favela carioca, no Centro do Rio. 

Há alguns meses, a Secretaria Municipal de Habitação pintou o muro de inúmeras casas com um número e as siglas SMH para identificar os imóveis que serão demolidos no local. 

Em 1808, sem moradia para membros da Corte, as casas recebiam as siglas P.R. (Príncipe Regente), que no popular virou “Ponha-se na Rua”.

Na Providência, muitas famílias foram pegas de surpresa porque sequer foram comunicadas da decisão da prefeitura. “Estava trabalhando. Quando cheguei em casa, levei um susto. 

O muro da minha estava marcado”, criticou o motociclista Wagner Teixeira, 36 anos, que apagou a inscrição. “É muito humilhante”, diz. Como ele, muitos moradores se negam a deixar suas casas. “Com o valor que ofereceram (R$ 50 mil) não consigo comprar outra casa do mesmo tamanho da minha”, destaca.

José Manoel só terá o imóvel reformada e, diferente de vizinhos, estava em casa quando ele foi marca | Foto: João Laet
José Manoel só terá o imóvel reformada e, diferente de vizinhos, estava em casa quando ele foi marca | Foto: João Laet / Agência O Dia
O secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar, informou que a marcação é necessária para identificar, sem erros, as casas que serão removidas ou reformadas. “Se algum morador não foi avisado, esse não é o nosso procedimento habitual”, garantiu. De acordo com a Secretaria Municipal de Habitação, 832 residências — 515 em área de risco — serão removidas para dar lugar a obras de revitalização da Zona Portuária dentro do Programa Morar Carioca, que terá R$ 131 milhões.

O aposentado José Manoel de Freitas, 75, não se assustou com a marcação pois estava em casa. A preocupação dele é menor. Sua casa será reformada: “Não vão demolir, mas ficaram de voltar para fazer obras”. Já os vizinhos que vão ter as casas demolidas apagaram as inscrições da SMH. “Parece até a Família Real querendo tirar todo mundo de suas casas”, criticou o músico Sidney Ferreira, 37 anos.

Prioridade a famílias em área de risco

Moradores serão reassentados em 752 unidades que serão construídas no entorno da Providência. A prioridade será dada às famílias em moradias de áreas de risco. No total, 134 já foram demolidas e 157 famílias já foram reassentadas.

De acordo com a Secretaria de Habitação, as obras de infraestrutura incluem implantação de novas redes de água, esgoto e drenagem, além da construção de um teleférico e de um plano inclinado para facilitar a circulação e acessibilidade dos moradores.